Julio Cortázar, no seu livro “Histórias de Cronópios e de Famas”, propõe uma série de Instruções muito originais (e completamente desnecessárias!), para concluir corretamente certas atividades que todos já sabemos fazer, como subir uma escada, dar corda num relógio ou chorar. Relendo o livro, me veio à cabeça escrever essas simples instruções:
Instruções para se sentir bem
Serene-se, aquiete-se, relaxe-se. Sorria levemente. Experimente assombro por estar vivo, por sentir, por pensar…
Olhe, toque, escute, assombre-se mais e mais. Respire esse ar de composição perfeita, que tanto necessita e que nunca lhe faltou. Mantenha acesa a gratidão alimentando-a com esses incontáveis milagres cotidianos.
Recorde: correu por uma praia, presentearam-lhe um filhotinho, recebeu um primeiro beijo. Pense nos seus amigos, nos seus amores, nos seus animais de estimação. Pense nos seus pais e nos seus filhos…
Agora não pense mais.
Bem, essa é a emoção. Experimente essa serena alegria, retenha-a, recorde-a. Enquanto permanecer nesse estado o Universo celebrará com você enchendo-o de bênçãos.
O desafio é conservar a felicidade ainda sem filhote, sem beijos e sem praia: antes de tudo descarte imediatamente a dor pela qual passou e a preocupação pelo que virá. E depois, para que nunca lhe falte, compartilhe a sua felicidade generosamente com os demais.
Axel Piskulic
Parece-me que a menina da foto não precisa de instruções para se sentir bem. E acredito que o seu gato também não.
Instruções para subir uma escada, por Julio Cortázar.
Ninguém terá deixado de observar que frequentemente o chão se dobra de tal maneira que uma parte sobe em ângulo reto com o plano do chão, e logo a parte seguinte se coloca paralela a este plano, para dar passagem a uma nova perpendicular, conduta que se repete em espiral ou em linha quebrada até alturas sumamente variáveis. Abaixando-se e pondo a mão esquerda numa das partes verticais, e a direita na horizontal correspondente, se possui momentaneamente um degrau ou um escalão. Cada um desses degraus, formados como se vê por dois elementos, situa-se um tanto mais acima e adiante que o anterior, princípio que dá sentido à escada, já que qualquer outra combinação produzirá formas talvez mais belas ou pitorescas, mas incapazes de transportar às pessoas do térreo ao primeiro andar.
As escadas se sobem de frente, pois de costas ou de lado tornam-se particularmente incômodas. A atitude natural consiste em se manter de pé, os braços dependurados sem esforço, a cabeça erguida ainda que nem tanto que os olhos deixem de ver os degraus imediatamente superiores ao que se pisa, e respirando lenta e regularmente. Para subir uma escada começa-se por levantar essa parte do corpo situada embaixo à direita, quase sempre envolvida em couro ou camurça, e que salvo exceções cabe exatamente no degrau. Colocando no primeiro degrau dita parte, que para abreviar chamaremos de pé, recolhe-se a parte equivalente da esquerda (também chamada pé, mas que não se deve confundir com o pé antes citado), e levando-a à altura do pé, faz-se que ela continue até colocá-la no segundo degrau, com o qual neste descansará o pé, e no primeiro descansará o pé. (Os primeiros degraus são sempre os mais difíceis, até adquirir a coordenação necessária. A coincidência de nome entre o pé e o pé dificulta a explicação. Há que se cuidar especialmente de não levantar ao mesmo tempo o pé e o pé.)
Chegando dessa maneira ao segundo degrau, basta repetir alternadamente os movimentos até se encontrar com o final da escada. Se sai dela facilmente, com um ligeiro golpe de calcanhar que a fixa no seu lugar, do qual não se moverá até o momento da descida.
De “Histórias de Cronópios e de Famas”
Incrível! Um vídeo que tem a ver com sentir-se bem e com subir escadas:
Para se sentir bem subindo uma escada
Este vídeo faz parte de uma campanha da Volkswagen dirigida a mostrar que é possível modificar alguns hábitos das pessoas, simplesmente fazendo com que certas atividades que se deseja promover sejam um pouco mais divertidas.